quinta-feira, 24 de setembro de 2009

Um estranho poder de cura

UM ESTRANHO PODER DE CURA
( Kenzaburo Oe )

"Meu filho deficiente mental, Hikari, foi despertado pela voz dos pássaros para a música de Bach e Mozart e acabou produzindo suas próprias obras. As pequenas peças que ele inicialmente compôs eram cheias de frescor e prazer. Pareciam gotas de orvalho brilhando sobre a relva. A palavra inocência é composta do prefixo "in", que significa "não", e de "nocere", "ferir". Ou seja, ela quer dizer "aquele que não fere". A música de Hikari era uma manifestação natural de sua própria inocência. Conforme ele passou a criar mais obras, no entanto, não pude deixar de ouvir nelas também a voz de uma alma escura e atormentada. Apesar de deficiente, seus esforços extenuantes permitiram que ele melhorasse suas técnicas de composição e aprofundasse suas concepções. E isso fez com que ele descobrisse no fundo de seu coração uma massa de tristeza que até então ele fora incapaz de expressar com palavras. O fato de expressá-la em música cura Hikari de sua tristeza, é um ato de recuperação. Mais ainda, seus ouvintes aceitaram essa música como algo que também os fortalece e restaura. Nesses fenômenos, eu encontro as razões para acreditar no estranho poder curativo da arte."

Trecho do discurso de aceitação do Prêmio Nobel de Kenzaburo Oe

domingo, 13 de setembro de 2009

Prece ao Quixote

Prece ao Quixote

Ah, Quixote! Venha nos salvar com a chama, com seu grito, com sua capacidade de sonhar.
Venha com fidelidade de Sancho, com amor encantado de Dulcinéia, com sua espada afiada e certeira e com a sua lúcida loucura.

Precisamos destruir os moinhos de certos inventos que torturam o nosso sono e sonhos.

As máquinas de voar ameaçam nossas cabeças e deixam-nos um bélico medo.
Precisamos preservar o ar, o verde, as flores e pássaros para garantir a vida.

Quixote, amigo, os reis com todas as pompas e frenéticos discursos, são frágeis e torpes. Estão nus e presos ao engano.
São dirigidos por poderes invisíveis e temos que digeri-los diariamente nas imagens a cores da tevê. Eles enrolam as palavras e nos enrolam escondendo-nos o caos.

Ah, Quixote amigo, venha, venha com urgência nos salvar.


Do livro: Alice no País da Poesia
Poeta: Elias José
Editora: Peirópolis

sábado, 12 de setembro de 2009

Posso ter defeitos


"Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar irritado algumas vezes, mas não esqueço de que minha vida é a maior empresa do mundo. E que posso evitar que ela vá à falência.
Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver, apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.
Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e se tornar um autor da própria história. É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis no recôndito da sua alma. É agradecer a Deus a cada manhã pelo milagre da vida.
Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos. É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um 'não'. É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.
Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo..."

Fernando Pessoa.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Quero reeducar o meu olhar


Quero reeducar o meu olhar


Reaprender e reeducar o meu olhar porque, quando tenho a presunção ou pretensão de já ter aprendido, deixo de ter a abertura fundamental de quem é apaixonada pelas descobertas, pelo conhecimento.
Quero progredir no conhecimento de mim e do mundo, para isso é necessário reeducar o meu olhar, de modo que eu busque a novidade a todo momento e não me viciar com as paisagens fáceis e superficiais.
Quero aguçar o meu sentimento para que eu veja tanto no novo quanto no antigo o que eu não via antes.
Quero encontrar caminhos onde as barreiras pareçam intransponíveis, cruzar fronteiras.
Quero reeducar o meu olhar, o meu pensar. Reaprender sobre o mundo, respeitando sempre o espaço de dúvida que existe em cada certeza afirmada.
Quero uma percepção livre e leve para a criatividade.
Sei que reaprender a olhar o mundo não é tarefa fácil, pois se trata de abandonar o terreno das convicções de sempre, e aprender a arte do equilíbrio.
Em tudo isso há medo e insegurança, mas há também a alegria e o sabor da aventura, da novidade, da criatividade de me sentir criando caminhos e respeitando novos ares.
Quero criar novas conexões, descobrir novas relações, possibilidades mil.
Sei que reeducar meu olhar não é tudo. É apenas o começo para que eu reeduque minhas ações.
Rosa Cleide Marques

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Quando Me Amei de Verdade


Quando me amei de verdade
(Kim McMillen & Alison McMillen)
Quando me amei de verdade
pude compreender que em qualquer circunstância, eu estava no lugar certo, na hora certa.
Então pude relaxar.
Quando me amei de verdade
pude perceber que o sofrimento emocional é um sinal de que estou indo contra a minha verdade.
Quando me amei de verdade
parei de desejar que a minha vida fosse diferente e comecei a ver que tudo o que acontece contribui para o meu crescimento.
Quando me amei de verdade
comecei a perceber como é ofensivo tentar forçar alguma coisa ou alguém que ainda não está preparado.- inclusive eu mesma.
Quando me amei de verdade
comecei a me livrar de tudo que não fosse saudável.
Isso quer dizer: pessoas, tarefas, crenças e - qualquer coisa que me pusesse pra baixo.
Minha razão chamou isso de egoísmo. Mas hoje eu sei que é amor-próprio.
Quando me amei de verdade
deixei de temer meu tempo livre e desisti de fazer planos.
Hoje faço o que acho certo e no meu próprio ritmo. Como isso é bom!
Quando me amei de verdade
desisti de querer ter sempre razão, e com isso errei muito menos vezes.
Quando me amei de verdade
desisti de ficar revivendo o passado e de me preocupar com o futuro. Isso me mantém no presente, que é onde a vida acontece.
Quando me amei de verdade
Perrcebi que a minha mente pode me atormentar e me decepcionar.
Mas quando eu a coloco a serviço do meu coração, ela se torna uma grande e valiosa aliada.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Fui sabendo de Mim


Fui Sabendo de Mim
(Mia Couto, in "Raiz de Orvalho e Outros Poemas")


Fui sabendo de mim
por aquilo que perdia
pedaços que saíram de mim
com o mistério de serem poucos
e valerem só quando os perdia
fui ficando
por umbrais
aquém do passo
que nunca ousei
eu vi
a árvore morta
e soube que mentia.